Freud, além da alma: roteiro para um filme
Em 1958, o filósofo e escritor Jean-Paul Sartre foi
convidado pelo cineasta John Huston para fazer um roteiro sobre o pai da Psicanálise,
Sigmund Freud. O roteiro não foi aprovado, mas em compensação, ganhamos um
livro muito interessante, que descreve em minúcias como Sartre via Freud nos
anos que antecederam seu sucesso. Freud, além
da alma (editora Nova Fronteira; 2005; 636 páginas; tradução de Jorge Laclette)
mostra as fragilidades e dúvidas do doutor da Universidade de Viena que ainda
hoje é amplamente estudado e reverenciado.
A história começa em 1885, quando Freud ainda trabalhava com
o professor Meynert no setor de Neurologia em um hospital de Viena. Por
discordar da forma como eram tratadas as vítimas de histeria, Freud vai à
Paris, para ter aulas com Dr. Charcot, figura polêmica no meio acadêmico,
considerado por muitos, inclusive por Meynert, como um charlatão por utilizar a
hipnose nos tratamentos.
Aliás, são muitas figuras masculinas fortes na história.
Além de Meynert e Charcot, há Breuer e Fliess, todos médicos. Em determinado
momento, Freud admite que esses amigos ou mestres são utilizados por ele como
uma espécie de muleta, como se ele precisasse sempre de um mentor para dar asas
às suas ideias e experimentos.
Sartre coloca de forma muito sutil sentimentos ou
pensamentos do protagonista que depois perceberemos que têm muita importância.
Uma delas, é a forma como ele percebe o antissemitismo que já era explicitado
na Europa. Outra, é a relação controversa que ele tem com o próprio pai. Entre
as neuroses que ele tem a coragem de admitir, está o medo de perder o trem, o
que o fazia chegar na estação com duas horas de antecedência. Revelar seus
próprios demônios foi crucial para seguir adiante em suas pesquisas e para resgatar
o respeito de Meynert.
Os pacientes do roteiro são baseados em pacientes verdadeiros,
sendo que o maior destaque é da jovem Cecily, que em escritos de Freud recebeu
outro pseudônimo: Anna O., e que foi importante para ele consolidar certos
conceitos da Psicanálise ligados ao inconsciente.

Em 1962, chegou às telas o Freud, the secret passion (no Brasil, Freud, além da alma), estrelado por Montgomery Clift, com roteiro
de Charles Kaufmann e Wolfgang Reinhardt. O nome de Sartre não aparece por exigência
do próprio filósofo. O filme foi indicado ao Oscar de Roteiro Original de 1963.
Mesmo com tantas idas e vindas, é visível identificar, na obra de John Houston,
alguns pontos cruciais do psicanalista anotados pro Sartre, que conhecia bem
sua biografia.
(ao lado, Montgomery Clift na versão cinematográfica)
(ao lado, Montgomery Clift na versão cinematográfica)
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